segunda-feira, 21 de março de 2016

A culpa NÃO é dos Motoristas!

Por Sérgio Franco






"...o motorista Carlos Rocha acha que é amiga demais (Niterói é amiga dos ciclistas). Por email, ele critica a construção de ciclovias e pede prioridade para a mobilidade dos carros:
— A cidade não comporta ciclovias. O incidente que aconteceu (a briga da semana passada) é resultado da falta de espaço para a circulação de carros. Ainda mais com ciclovias!"

"O taxista Almir Gomes não tem problema com ciclistas e diz que os apoia, desde que estejam longe:
— Eu acho que a ciclovia tem que ser feita onde tem espaço, e aqui em Niterói não tem."

Estas declarações se encontram na matéria do Jornal O Globo, com o título de "Clima tenso entre ciclistas e motoristas cresce em Niterói"
Chamada da Matéria!

Cabe aqui uma observação: Não existe clima tenso entre motoristas e ciclistas crescendo em Niterói! "Desentendimentos" ocorrem entre qualquer dos personagens (pedestres, ciclistas, motoristas e motociclistas) que convivem no trânsito e na sua maioria são problemas pontuais que ocorrem por diversos motivos inclusive por falta de informação. E ainda, grande parte dos ciclistas é composta também por motoristas! 

Mas por que os motoristas que fizeram estas declarações não tem culpa de pensar assim?

Porque o conhecimento sobre mobilidade urbana não chega até estes de forma ativa. Eles, não são obrigados a entenderem deste assunto específico, cada cidadão tem suas áreas de interesse das quais gostam de ler sobre e procurar maior informação. Portanto, a culpa é das administrações públicas, sejam a nível Federal, Estadual ou Municipal, levarem de moto ativo, o conhecimento dos benefícios de uma ciclovia.

Para o motorista, o cidadão comum, aquele que sai de sua casa para ir trabalhar e opta por usar o carro, seja por qual motivo for e tem liberdade e direito de assim o fazer, ao olhar uma ciclovia, o primeiro pensamento é: "Poxa, menos uma pista, olha só, dava para mais carros..."; não é o primeiro pensamento dele que um sistema cicloviário seguro, bem pensado, que ligue pontos de interesses, na verdade melhora o trânsito pois traz a mais simples das soluções, tira carros das ruas!

"— A cidade não comporta ciclovias. O incidente que aconteceu (a briga da semana passada) é resultado da falta de espaço para a circulação de carros. Ainda mais com ciclovias!"

Seguindo a lógica do pensamento "falta de espaço para a circulação de carros", uma das soluções seria desapropriar todos os prédios ao longo da Av. Roberto Silveira, e provavelmente de todas as vias, para ter mais espaço de circulação, ou construir um grande elevado que leve cada motorista até a porta de casa. O que é impossível.

"— Eu acho que a ciclovia tem que ser feita onde tem espaço, e aqui em Niterói não tem.", e segue-se a mesma lógica de declaração anterior. Feita por um profissional que tem que estar nas ruas dirigindo o dia inteiro. 

É justamente por não ter espaço nas ruas que necessitamos de ciclovias!

A lógica tem que ser invertida, ou seja, vamos criar condições para que mais pessoas usem a bicicleta e deixem seus carros em casa para que aquele que realmente necessite usar o carro tenha uma melhor fluidez no  trânsito com menos engarrafamentos.
Raio de 5 km

O mapa ao lado ilustra as localidades abrangidas no raio de 5 km a partir da estação das barcas no Centro de Niterói.

Esta distância é facilmente percorrida de bicicleta, não levando mais de 30 min pedalando devagar. 

Agora pense nas pessoas que cada um de nós conhecemos que percorrem estas distâncias de carro.

Vamos pensar ainda em quantas pessoas, que cada um de nós conhecemos, que não usam a bicicleta por não ter ciclovias.

Cada uma destas pessoas formam um grande conjunto de possíveis "carros á menos" ou "mais espaço para os carros". 

E sim, existem pessoas dispostas a usar bicicletas, e são muitas, o que não tem é segurança de usar por falta de um sistema cicloviário seguro. Em pesquisa realizada pelo Mobilidade Niterói em parceria com o Niterói de Bicicleta (Matéria relaciona aqui) constatamos que entre os não ciclistas:

  •  87% Concordam que uso da bicicleta é uma boa opção como meio de transporte no dia-a-dia.
  •  90% Concordam que uso da bicicleta melhora o trânsito nas ruas e avenidas.
  •  63% Concordam que o uso de bicicleta NÃO é restrito a alguns perfis/tipo de pessoas.
  •  94% dos entrevistados usariam a bicicleta como meio de transporte se determinadas demandas fossem atendidas.

Com menos carros teríamos melhor fluides para o Sr. Carlos Rocha usar seu carro e para o Sr. Almir Gomes trabalhar de maneira menos stressante no seu dia a dia de taxista, aliás, também importante função para a melhoria da mobilidade na cidade. Provavelmente faria mais viagens e teria mais passageiros.

Mas como dito acima, não, eles não tem culpa de pensar assim, a culpa é principalmente do poder público de não levar estas informações de forma clara à população.

Na contagem automática de 12 horas, realizada na Av. Roberto Silveira (Matéria aqui), foram contabilizados 1035 ciclistas, em um dia de chuva, o que muito provavelmente diminuiu o número de usuários de bicicletas. E são ciclistas dos mais diferentes perfis! O que o Sr. Carlos e o Sr. Almir achariam se pelo menos metade destes ciclistas resolvessem usar os carros? E estamos falando de uma ciclovia que não é interligada com o Centro, principal destino dos ciclistas localizados na área do mapa acima.

Mas o que mais pode ser feito?

Além das informações sobre mobilidade urbana enfatizando que a ciclovia atrai mais ciclistas e diminui o número de motoristas melhorando portanto o trânsito pela simples diminuição de automóveis nas ruas, existem atitudes mais práticas que deveriam ser adotadas pela prefeitura o quanto antes.
Ciclorrotas

Na administração anterior a NitTrans tinha uma visão muito mais abrangente sobre mobilidade urbana e entendia que fazer o trânsito fluir é também criar condições para que as pessoas deixem os carros em casa. 

Cabe ressaltar que não estamos elogiando a administração anterior como um todo, nem mesmo criticando. Estamos tão somente falando de um único órgão, NitTrans.


Sinalização de Ciclorrota
Com isto foram dados os primeiros passos para a instalação das primeiras ciclorrotas, que legitimam o uso das vias pelos ciclistas e alertam os motoristas sobre a presença dos mesmos nas vias. Cabe lembrar que o CTB já regula o uso das vias pelas bicicletas:

"Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores."

Solução simples, barata e de fácil implantação que já aumenta a segurança dos ciclistas e esclarecem aos motoristas que sim, o ciclista pode e deve usar a via.

É o ideal? Não, é apenas um passo para chegar a condição ideal e uma solução que deveria estar sendo aplicada em todas as vias onde não existem ciclovias. Seriam mais pessoas a adotarem a bicicleta e menos carros nas ruas. 

Mas deixamos claro que as ciclovias proporcionam maior segurança, atraindo novos adeptos da bicicleta como meio de transporte. Um bom exemplo foi o aumento constatado de 57,14% no trecho entre a Rua Lopes Trovão e Rua Presidente Backer, quando comparamos antes e depois da instalação da ciclovia. (Matéria Aqui)

Mas não é só isso, existem as placas educativas já regulamentadas. Qual a finalidade delas? Educar os usuários da via quanto ao seu comportamento adequado e seguro no trânsito. 

Placas Educativas

A ferramenta existe. Estas placas ajudariam aos motoristas, ciclistas e pedestres a aprenderem a conviver no trânsito, dando orientações simples de como proceder em determinados locais e situações. 

Exemplo 1
 A grande maioria dos motoristas não retornam a ler o CTB e se esquecem dos procedimentos que devem ser adotados nas mais diversas situações.

Estas placas servem para lembrar e até para instruir como proceder.

Até porque estamos vivendo uma mudança de paradigmas e inclusive pela falta de espaço citada pelos motoristas acima, novas alternativas de transporte tem que ser buscadas, e a bicicleta é uma das de mais fácil implementação.

Exemplo 2
O motorista, também foi pego no meio desta mudança e se mobilidade não é o assunto de seu interesse (e não é obrigado a ser) este se vê confuso no como proceder nas novas situações que naturalmente surgem deste convívio.

Exemplo 3
E não estamos eximindo o ciclista de sua parcela de responsabilidade, mas da mesma forma que é  uma novidade para o motorista é também para o ciclista, principalmente para os novos ciclistas (aumento de 78,68% comparando Fev/15 com Fev/16). E da mesma forma que o motorista não tem obrigação de entender de mobilidade urbana, muitos ciclistas também não tem interesse no assunto, apenas descobriram e adotaram as bicicletas como meio de transporte (mesmo inconscientemente estão criando mais espaços na rua quando deixam seus carros em casa). Estes ciclistas também tem dificuldade de entender como se comportar em áreas de embarque e desembarque, em paradas de ônibus, no uso da via, etc. Mais um motivo para serem usadas as placas educativas.

Placa na BR277

Todos os eventuais conflitos existentes nas ruas entre ciclistas e motoristas são consequência simplesmente da falta de informação.

Claro, bicicleta não é a única ferramenta para melhorar a mobilidade urbana, existem várias, BRTs, BHLTs, melhor planejamento das linhas de ônibus e suas paradas, VLTs, trens e metrôs, mas as ciclovias, como já dito, são as mais rápidas e baratas de serem implementadas e são parte importante de um sistema que vise a mobilidade urbana. Mesmo assim entendemos que mesmo com tudo isto, ainda existirão carros nas ruas, mas estes terão maior facilidade de locomoção, justamente por ganharem mais espaço pela diminuição dos automóveis particulares nas vias.

Mas cabe ressaltar, se hoje discutimos mobilidade urbana é porque ontem não houve planejamento urbano. As cidades crescem de forma horizontal e afastam as pessoas dos centros econômicos, forçando com isto grandes deslocamentos e piorando o trânsito. Erro que hoje vemos ocorrer em Niterói com o crescimento da região oceânica. 

Niterói, já é compacta, não precisa expandir.

Vídeo:

Cidades densas são cidades melhores - Streetfilms & ITDP Co Production


Artigo:
Desenvolvimento Orientado Ao Transporte Sustentável

facebook/mobilidadeniteroi


As distâncias são curtas
Tire proveito da situação
Deixe o carro em casa!

5 km Região Oceânica





















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